À memória de Messias Soares

 

A vida brasileira tem se esmerado em deixar para os fins de semana a resolução dos seus problemas mais importantes. Para o autor destas mal-traçadas linhas eletrônicas, regularmente publicado neste espaço às segundas-feiras, esse capricho do nosso cotidiano é, a bem dizer, um suplício chinês. Se dar tratos à bola, aos sábados pela manhã, no afã de compreender e interpretar as travessuras nacionais não é tarefa fácil, o que dirá adivinhar para onde vai a trôpega carruagem verde-e-amarelo…Resta ao cronista, à falta de melhor adjutório, qual pitonisa depois da zika e da chikungunya, analisar as pistas e indícios do dia-a-dia na esperança de extrair algum sentido disso tudo e dar rumo à própria prosa, às vezes mais desmantelada que o voo de um anu.

 

Na última-quinta-feira, acompanhado da patroa, fui ao vernissage da exposição Fendas do meu caro José Guedes em sua Casa D’Alva. Uma multidão teve a mesma ideia que nós. Nas brancas paredes, arestas riscadas em negro sobre quadrados e retângulos pintados num azul profundo à Yves Klein abriam-se sutilmente em frestas claras, desafiando nossa visão espacial. Mais instigantes que as de Lúcio Fontana, decerto inspiração original, as gretas de Guedes me sugeriram, além dos sutis jogos geométricos, a possibilidade de escape, de fuga de uma caixa de veludo blue, tão bela quanto terrível. Resumindo: o sol para além da opressiva prisão azulada. Minha mulher, encantada, segredou-me: “Aqui, vai-se às mostras para ver e ser visto. Mas, e quanto à tal da arte?!”.

 

Porém, nem tudo são flores, sejam elas azuis ou furta-cores. A recentíssima perda de um amigo abateu-me profundamente. Saber-lhe ido, no dia seguinte a uma alegre libação por ele oferecida aos seus mais chegados, na qual fez questão de servir o generoso vinho em cada taça, doeu-me na alma. O sequestro repentino de alguém querido, pelo destino, é coisa difícil de aceitar. A outra cacetada foi a infausta notícia do fechamento do simpático Tocantins, talvez o bar-restaurante mais boêmio de Fortaleza em todos os tempos. Meu parceiro Assis Ximenes, antigo freguês do famoso caldo de peixe da casa, avisou-me do fim das atividades do estabelecimento. Noutro dia, o Bar do Manuel, na Gentilândia, teve a mesma sorte. O que nos dizem esses eventos?

 

 

Coluna do  Arquiteto e Urbanista, Romeu Duarte,