Praça Victor Civita/Museu Aberto da Sustentabilidade -São Paulo

Adriana Levisky e Anna Julia Dietzsch costumam recorrer ao simbolismo de uma embarcação


para referir-se à praça Victor Civita/Museu Aberto da Sustentabilidade, em São Paulo. Pois é da explicitação de um novo território que se nutre o projeto, cujo partido soluciona demandas antagônicas (público x privado, ocupação x sustentabilidade) e o conjunto de conhecimentos culturais e ambientais a elas vinculados.

O mote inicial do trabalho foi a recuperação de uma área degradada de São Paulo, marginalizada, mas geograficamente não periférica. O terreno a ser reabilitado era cercado por muros em toda a borda, de traçado irregular; ilhado entre os meandros de grandes lotes que abrigam órgãos públicos; vizinho ao fluxo impessoal da marginal do Pinheiros e castigado pela contaminação química herdada – o local abrigou o atualmente desativado incinerador de lixo de Pinheiros e posteriormente a atividade de coleta seletiva.

O embaraçoso estado de ociosidade e degeneração do lote acabou por motivar um movimento contrário, de recuperação e reinserção na cidade. Esboçou-se, então, uma parceria público-privada (PPP), que, encabeçada pela prefeitura de São Paulo e pelo Grupo Abril, mostrou-se receptiva às numerosas causas do emaranhado de demandas relacionadas ao projeto.

Para o grande lote, com cerca de 13,5 mil metros quadrados, por exemplo, era necessário considerar aspectos como a permanência das atividades de um grupo da terceira idade, a restrição à remoção de árvores frutíferas, o desejo de que se efetivasse a fruição urbana do espaço e se evidenciasse a edificação do antigo incinerador, assim como a necessidade premente de descontaminação do solo.

Em paralelo, os laudos técnicos preliminares sinalizaram às arquitetas que o contato humano com o terreno – ou seja, sua recuperação para posterior ocupação – só seria possível mediante o recobrimento quase total com terra sadia, o que configurava uma movimentação e tanto.

Diante da escala desconfortável de intervenção, surgiu a idéia de criar uma praça elevada, que resume o partido do projeto. “Fomos entendendo as condições do terreno e apreendendo sua personalidade, sua condição mista resultante do entrecruzamento dos contextos ambiental e urbano. A arquitetura precisava se posicionar claramente diante de importantes decisões de ordem tecnológica e ambiental”, reflete Adriana.

Foto Aérea A foto aérea evidencia o traçado diagonal da praça, ladeada pelos vários setores do museu aberto

Maquete Maquete

Edificação Preservada
Detalhe da praça, nas proximidades da edificação preservada

Acesso Principal Vista em direção do acesso principal, com destaque para as pontuações das áreas cobertas

O conceito de praça elevada abriu espaço para a ampliação do programa na direção da incorporação das atividades de um museu focado no conhecimento ambiental e cultural que a própria elaboração do projeto havia colocado em jogo. Assim, dado o seu caráter abrangente e marcante, acabou por tornar a arquitetura ferramenta vital para a viabilização e condensação das intenções da PPP. “Poderíamos ter abordado esses temas todos com uma proposta mais comum, algo como uma praça convencional, mas a estrutura que pousa sobre o terreno e se desenvolve em diagonal, seguindo um eixo natural, torna evidente o enfrentamento e o diálogo da arquitetura com o problema da degradação”, observa Anna Julia.

Arquibancada
A arquibancada tem capacidade para 240 pessoas

Piso e Laterais O piso e as laterais da praça suspensa têm desenho contínuo, como se o plano vertical fosse inflexão do horizontal

O volume da praça, a vedete do projeto, é, então, definido pela continuidade do plano horizontal do piso na superfície vertical dos fechamentos laterais, um desenho marcante e de perfil arredondado. Sintonizado com a vocação sustentável da proposta, seu embasamento utiliza estrutura metálica de componentes reciclados e seus fechamentos mesclam espécies de madeira certificadas, apropriadas ao grande fluxo e à exposição às intempéries.

Materiais e sistemas permeáveis de piso, aliados a áreas de agricultura e tratamento para reúso das águas, conformam um percurso museográfico a céu aberto que se interliga às atividades educativas e culturais da praça. O projeto, assim, ao examinar temas universais e de grande interesse urbano, extrapola seu contexto pontual de intervenção.

Adriana Levisky (FAU/USP, 1992), sócia titular do escritório Levisky Arquitetos Associados, junto com Renata Gomes, foi diretora da Asbea em 2005, participou do desenvolvimento do plano diretor regional do Butantã (2002/03), trabalhou no escritório Brasil Arquitetura e no Instituto Lina Bo e P. M. Bardi.

Anna Julia Dietzsch é arquiteta sênior e sócia-diretora da filial paulistana do escritório Davis Brody Bond, de Nova York, pelo qual gerenciou projetos como o Museu do Memorial World Trade Center; no Brasil, desenvolveu projetos em parceria com o escritório Andrade Morettin

Texto de Evelise Grunow
Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 349 Março de 2009

Volume Edificado
A praça é um volume edificado, que pousa sobre o terreno

Deque
O deque de madeira abriga atividades variadas, como o espaço para ginástica

Piso de Paralelepipedo
O piso de paralelepípedo cerca a edificação preservada

Tubulação Aparente A edificação dedicada à terceira idade utiliza sistema pré-fabricado de construção, com materiais e tubulações aparentes