Romeu Duarte, Conselheiro Vitalício do IAB- CE e Ex-Presidente da entidade nacional, escreve em sua coluna semanal no jornal O POVO.

“Qual engarrafamento, o do viaduto, acima da gente, ou este em que nós estamos metidos?”, brincou ele, gaiato.

“Não aguento mais ouvir as seguintes palavras: viaduto, túnel, alça, rotatória…”, disse ele ao volante, o mar de automóveis à frente. “Cala a boca e presta atenção no engarrafamento, senão tu acaba batendo no carro de alguém”, disse ela aborrecida e com várias pulgas atrás das orelhas. “Qual engarrafamento, o do viaduto, acima da gente, ou este em que nós estamos metidos?”, brincou ele, gaiato. “Deixe de gracinha, abestado, que hoje eu não estou pra brincadeira. Pensa que eu não vi, pensa que eu não sei?”, provocou ela, coroa de cabelo louro mechado ainda dando um bom caldo.

“Viu o quê, sabe de quê?”, blefou o artista, pagando para ver. “Tu se botando para a atendente nova, safado”, rebateu a falsa loura na bucha. “Criatura, não tem nada a ver, tu parece que acordou hoje decidida a entrar no Black Bloc, é só pedrada pro meu lado…”, contemporizou o esperto, já emendando: “Um feriado desses, solzão, a praia nos esperando e nós aqui enganchados”. “Também, né, abestado, quem mandou vir direto para a procissão de Nossa Senhora da Assunção? Agora é esperar”. “É a segunda vez, em menos de cinco minutos, que tu me chama de abestado. Dá um tempo, Carol…”.

 “Carol?! Que papo é esse de Carol?! Meu nome é Patrícia, cabra, tua mulher, Carol é a quenga da atendente! O nome dela não sai da tua cabeça, né, bicho véi fingido?”, abarcou ela, pronta para brigar. “Amor, me perdoe, foi mal, é tanta coisa na minha cabeça…”, desculpou-se ele, de fininho. “Desse jeito, tu vai acabar é com mais coisa aí na cabeça…”, ameaçou a do batismo trocado. “Calma, que eu vou dar um jeito de escapulir daqui“, desviou ele, de assunto e do curso do engarrafamento, tomando uma rua lateral. “É carro demais aqui. 869 mil veículos, 492 mil carros, 216 mil motos, 6 mil veículos novos por mês, égua”, contabilizou ele. “E eu com isso? Quero nem saber. Temos é que trocar esta lata velha. Carro bom é o do ano”, determinou a rodoviarista.
 

Estou pensando é na atual situação política do País e do mundo”, ruminou o malandro. “Os governadores do Rio e de São Paulo acuados, sem poder tomar um café na esquina, o daqui com pepinos aeronáuticos, ambientais e gastronômicos, nosso prefeito, assim como o Lula, anda sumido, a Dilma lá em baixo nas pesquisas, a oposição mais fraca que caldo de bila, o Barbosão batendo boca no Supremo, sei não, parece que o cão saiu da garrafa”. “E tu vai resolver alguma coisa choramingando?”, devolveu ela, impassível. “Depois de junho, eu quero é ver quem é o doido que ainda vai dar a mão a político no Brasil”, desafiou a consorte, as unhas negras sobre o short apertado.

“E no estrangeiro?”, continuou ele, afastando-se dos carros velozes. “No Egito, é peia pra dez num cristão, quer dizer, num muçulmano. Estão matando gente por lá que nem presta, só ontem foram mais de quinhentas pessoas. O caso do Snowden, Obama, Putin…”. “Não precisa dizer palavrão. O nêgo véi Obama bem que mereceu, não tem porque reclamar ou ficar com raiva. Ele não vive xeretando a vida de todo mundo? Quem com o ferro fere tanto bate até que fura…”, decretou a dona, limpando o batom do canto da boca. “Você misturou os ditados, amor”, corrigiu o do guidom, tirando sarro dela com um risinho.

 “E tu, seu abestado, misturou foi os caminhos! Todo metido a sabido e nós aqui de novo num engarrafamento, ainda maior do que aquele em que a gente estava! E agora?”, grunhiu ela, sem futuro. “É muito azar, pegamos a procissão de Iemanjá, adeus banho de mar, cervejinha gelada, caranguejo…”, lamentou-se ele. “Sai do meio, magote de macumbeiro! Deixem a gente passar!”, ela, aos gritos, metade do corpo fora da viatura. “Amor, olha o preconceito, cuidado com as palavras, alguém pode achar ruim, Carol…”. Ato falho, olho roxo, praia perdida, silenciosa volta ao abalado lar.

Fonte: Jornal O POVO.