Foto: Tattiana Forte ( Jornal O Povo 05/08/2016)
Caros leitores, peço um crédito de paciência. Sei que há dois domingos saí das memórias de Das Antigas e me embrenhei pela precariedade administrativa e o faz de conta que é o Parque Natural Municipal da Sabiaguaba.
Fortaleza precisa da existência daquelas dunas e brigar por um impacto mínimo ali. Antes que o próprio Poder Público e o silêncio dos cidadãos permitam que o Parque e a APA da Sabiaguaba se transformem em um Parque do Cocó ou no que se deu com o mangue da Vila Velha (Barra do Ceará). Antropizados e suplicantes para que não sejam ainda mais depauperados pela especulação imobiliária e invasões.
Pois bem. Fui ler o Plano de Manejo da Sabiaguaba, coisa que o Cocó até hoje não tem. Organizado pelo geógrafo Jeovah Meireles (UFC), o documento é obrigatório para existência do Parque e traça como deveria ser a vida sustentável da floresta, das dunas, dos aquíferos, do mar, dos animais, dos moradores históricos e de visitantes.
Tudo errado, até aqui, dez anos depois dos decretos municipais que criaram o Parque e a APA da Sabiaguaba. Tivesse uma administração comprometida e assídua, a CE-251 nem existiria. Um crime ambiental.
A CE-025 teria sido reestruturada e, pela avenida Maestro Lisboa, faria a ligação da Paria do Futuro com o município do Eusébio.
Outro detalhe. Como foi construída na marra pelo Governo do Ceará e com a conivência da Prefeitura de Fortaleza, asfalto, ali, jamais.
Ora, estamos falando de uma Área de Proteção Integral e não de um loteamento oportunista, sem critério ambiental, que desmata a Terra para vender o insustentável.
A CE-251 rasgou a legislação e o Parque na zona de amortecimento e na área de recuperação da mata de tabuleiro. Um bosque ralo, típico daquele ambiente, e que tem também a função de fixar as dunas.
Os impactos negativos são vários, inclusive para as reservas de água doce. Mas um é mais visível. A duna gigante (e linda) está retomando um trecho que a CE-251 comeu. E vai soterrá-la e, provavelmente, poderá haver acidentes com o tráfego de veículos. Lógico.
O alerta está no Plano de Manejo do Parque, desde 2010 e em laudo de 2014. É o mesmo crime cometido com as dunas do Porto das Dunas, logo após a ponte do rio Pacoti, e com o morro de São Tiago (Santiago), na Barra do Ceará.
Depois da mancada e do prejuízo que sairá do bolso do cidadão, e por pressão de parte do Conselho Gestor da Sabiaguaba, o Governo se viu obrigado a desfazer 600 metros do asfalto e colocar pavimentação que permita a permeabilidade do solo e a redução da velocidade de veículos. O que não cessa a ilegalidade no Parque e o crime à duna.
Camilo Santana (PT), um homem que parece bem intencionado e autor da dissertação/crítica de mestrado (UFC) Análise da efetividade dos estudos de impacto ambiental: o caso do Ceará, poderia ler o Plano de Manejo e ver que as vias no Parque têm de ser paralelepípedo. Asfalto não é para floresta de dunas. A CE-251 nem era para existir e há uma ação do MPCE.
E, por ser um funcionário público ligado a órgãos ambientais, Camilo poderia aconselhar o prefeito Roberto Cláudio (PDT): 1. A cercar o Parque da Sabiaguaba; 2. Nomear um administrador para decidir com o Conselho Gestor; 3. Fundar uma sede-centro de pesquisa no local; 4. Combater as invasões; 5. Não abrir caminho para especulação imobiliária; 6. Tornar o Parque um lugar de uso e visitação sustentáveis e seguro… E é só o começo.
DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO
Coluna publicada originalmente no Jornal O POVO de 07/08/2016